quinta-feira, 23 de abril de 2020

O Reino de Castela não é Reino estranho


O Reino de Castela não é Reino estranho
Em Carta regia de 17 de Agosto de 1639 - Havendo vista a consulta que me fez a Mesa da Consciencia e Ordens, e me enviastes com vosso parecer, ácerca de não ter effeito, nem passar adiante a mercê que fiz a D. Antonio da Silva, do Habito de Christo, houve por bem de resolver que a dita mercê tenha effeito, sem embargo do que consultou a Mesa de Consciencia; a quem advertireis que o Reino de Castella não se reputa por Reino estranho; e que com esta consideração, quando fallarem em semelhantes materias, o façam.
 Miguel de Vasconcellos e Brito.
JJAS, 1634-1640, p.194.

Falta de socorro a
navios de guerra espanhóis
Por Decreto de 30 de Abril de 1631 - foi estranhada a falta de soccorro que acharam duas embarcações de guerra hespanholas na Ilha Terceira; ordenando-se as necessarias prevenções, para que não se praticasse o mesmo para o futuro.
JJAS. 1627-1633, p. 209

Motim de Évora
Por Alvará de 20 de Janeiro de 1638 - foi concedido perdão aos culpados no motim de alterações de Evora, exceptuados os cabeças, que iriam declarados em outra Provisão. Vd. Carta Regia de 3 de Dezembro de 1637.

Por Alvará de 20 de Fevereiro de 1638 - foram declarados os cabeças das alterações de Evora, que haviam sido exceptuados no Alvará de 20 de Janeiro deste anno.

Por Carta Regia de 27 de Fevereiro de 1638 - foi determinado que o Corregedor do Crime da Côrte, Diogo Fernandes Salema, passasse com alçada a Evora e Crato, e inquerisse sobre os exceptuados do perdão, e lhes impozesse as penas correspondentes. - Vid. Decs de 20 de Janeiro e 20 de Fevereiro e

 Resolução de 7 de Julho de 1638 - Manda lançar finta aos moradores de Evora, para as despesas da Alçada.
JJAS, 1634-1640, pp. 143, 146, 154.

Outros motins
Em Carta Regia de 28 de Fevereiro de 1638 - Com carta vossa de 13 do presente se recebeu uma consulta do Desembargo do Paço, sobre a reducção dos logares, que, na Commarca de Campo de Ourique, se haviam inquietado, tornando-se a pôr nelles, e nas Villas de Loulé, Castro Marim, Cazella, e Alcoutim, o Real d''Agua - de que fico advertido - e vos encomendo que, assim destes Logares, como dos mais que se houverem reduzido, ordeneis se me enviem os Assentos, como já vol-o encarreguei por outra Carta.
Miguel de Vasconcellos e Brito
JJAS, 1634-1640, p 146.

Incêndios em Cartórios
O Regedor da Casa da Supplicação ordene que, correndo nella algumas causas, cujos processos tenham ardido nos incendios dos Cartorios, que houve nos logares onde succederam inquietações, se sobrestabelecer nellas, em qualquer estado em que se acharem, até Sua Magestade mandar, sobre o que lhe tenho representado, resolver a fórma que nisto é servido que se tenha; porque, sendo esta materia geral, não convirá que nella se proceda sem especial ordem de Sua Magestade:
E em primeiro caso disporá assim no livramento do Juiz dos Orfhãos de Portalegre, a quem, segundo intendi do Doutor Thomé Pinheiro da Veiga, sahiram, ao correr da folha, certas culpas, cujos autos tinham ardido no incendio dos Cartorios daquella Cidade. Lisboa a 18 de Fevereiro de 1638.
- A Princeza Margarida.
JJAS, 1634-1640, p.144.

Declare-se nas consultas
se nelas entram sediciosos
Fez-se a diligencia para se saber se havia mais pertendentes a esta serventia (de Mamposteiro-mór de Portalegre) com que se enchesse o numero que Vossa Magestade quer que se lhes consulte - e por tambem darem petições em que a pedem Paulo Rodrigues e Sebastião Marques, allegando serem pessoas de satisfação, os propomos a Vossa Magestade, pelo mesmo tempo de dous annos, por que propomos em primeiro logar a Diogo Fernandes Marujo, pelas que nesta consulta ficam apontadas. Lisboa 13 de Outubro de 1637. - Com Rubricas.
JJAS, 1634-1640, p. 132

Admissão de leitura para o lugar de Ouvidor
nas terras do duque de Torres Novas
Em Carta Regia de 19 de Fevereiro de 1638 - Havendo-se-me representado por parte da Duqueza de Torres Novas que nas terras do duque seu filho estão vagos alguns logares de Ouvidores; e sendo preciso nomear Letrados que hajam lido no Desembargo do Paço, os não ha; pedindo-me lhe fizesse mercê de licença para lerem alguns, sem embargo da ordem que ha minha em contrario - tendo respeito ao procedimento da Duqueza nestes tumultos merecer mais, fui servido conceder-lhe que, sem embargo da ordem em contrario, possa lêr um Letrado, como outro que já se lhe concedeu; com tanto que  esta licença não sirva de consequencia.
Miguel de Vasconcellos e Brito
JJAS, 1634-1640, p. 144.

Sedições de Évora
e Restauração do Brasil

Carta Regia de 3 de Dezembro de 1637
Senhora Prima: Ainda que, depois que succedi nesses Reinos, hei procurado como cousa mais propria de minha obrigação, a satisfação de todos meus subditos, assim em seu Governo como na administração da Justiça, em que mais principalmente consiste sua quietação, com particular attenção hei desejado a desse, e conservação de seus Estados, levando-me não sómente a isto a inclinação, e amor de tão bons Vassallos, senão o conhecer que como mais de suas Conquistas, necessitam mais de minha assistencia e cuidado:
(...)
Meu intento, depois que hão succedido estas inquietações, ha sido sempre, que, conhecendo seu erro, os inquietos se reduzissem, com a persuadição de seu mau estado, e meios que applicariam os leaes, e bem intencionados, ao que tinham antes que começassem os alborotos.
E que quando perseverassem em sua obstinação, experimentassem os damnos della, com o valor e rigor que sollicitiava a gente nobre, e leal, por tão abominavel excesso, escusando a nota dentrar gente de outros Reinos, com força de armas, a pôr remedio com que se confirmaria a sedição, sem gloria e honra que receberia Portugal, sendo seus naturaes os que, com exemplo grande no futuro, haviam conseguido acção tão gloriosa para elle, e de tanta estimação para mim, como seria confundir, e castigar os inquietos e sediciosos.
O ver isto até agora desencaminhado, me tem com summo sentimento; e cresce, quando reconheço effeitos, tão a sua mesma obrigação, tomando pretextos tão contra toda a razão e justiça, como é levantar a paga de tributos que hoje não se impunham de novo, senão que assentadamente se pagavam para seu mesmo beneficio, que consiste na restauração do Brazil, pois se se perdesse, o que Deus tal não permita, totalmente ficaria destruido o Reino.
Chegou-me aviso do alboroto de Evora, de que igualmente se fez pouquissima consideração, porque tumultos populares se vêem cada dia, sem nenhum inconveniente - o que mais novidade me causou foi a ponderação com que se escrevia desse Reino, e fallava aqui na materia, e que moveram algumas circunstancias que de longe mal se podem julgar.
Chegaram segundos e terceiros avisos, de que se estendiam os inconvenientes - e achando-me satisfeito da providencia com que o Duque de Bragança havia reparado em parte a materia, em Villa Viçosa, e outros Logares seus, e offerecendo-se em tudo, lhe dei muitas graças, pois nisto, como sempre, obrou seu sangue.
Tambem agradeci aos Fidalgos de Evora sua vontade, e lhes encarreguei obrassem com minha authoridade.
O Bispo de Portalegre, e o Conde de S. João, seu pai, me deram um papel, sobre o que convinha despachar a Armada do Brazil, e meios para que não o embaraçassem as inquietações - e desejando que isto se conseguisse, como o unico para a restauração daquelle Estado, em que consiste o bem universal desse Reino, o remetti, para que se visse, e se considerasse com toda a attenção.
Aprovaram-n'o o Conselho de Portugal, e os Conselhos de Estado, Guerra, e Castella, e Junta de Pernambuco, que se compoem dos primeiros Ministros de minha Monarquia, por sua experiemcia, zelo, e attenção; e assim o resolvi, e remetti ao Conselho de Estado desse Reino, e Desembargo do Paço, deixando á sua eleição a execução.
Não resolveram nada, e poucos votaram bem, muitos nada, e alguns mui mal - havendo passado mez e meio, e tratam-se de não dissimular mais, porque os inconvenientes cresciam, e o descredito e desauthoridade da justiça era grande.
O Bispo de Portalegre, e o Conde de S. João, havendo-se juntado com todos os Fidalgos portuguezes que havia na Côrte, me deram outro papel, reconhecendo por summo favor o que eu olhava pela honra desse Reino, e pedindo-me que só o braço da Nobreza, e os Ministros, remediassem logo com effeito esta turbação, e se pozesse a justiça no logar que se deve, para que os que ouvissem que se havia levantado uma parte de Portugal, ouvissem juntamente que se havia remediado pelos mesmos Portuguezes.
Agradeci-lhes seu zelo, e approvando sua proposta, a remetti a esse Reino, em que não se obrou mais que reproval-a, sem dispor nenhum outro meio.
Passou este fogo ao Algarve - então se me representou que era necessario força.
Ordenei aos Fidalgos de Evora, que persuadissem áquella gente o estado em que se achavam, que era certa sua perdição, se não se reduziam a seu primeiro estado, e recorriam ao refugio de minha clemencia e piedade; admirando que tanto tempo, como ha que durava aquella inquietação, não houvessem procurado separar o trigo da sisania, e reduzir com segredo a alguns dos indifferentes, e assegurar os bons, pois não podia deixar de haver muitos.
Tambem lhes estranhei não me haverem dado conta de quem, e quantos eram os cabeças, e os mais prejudiciaes que os seguiam.
Pedio Justiças novas - parece que vós, o Conselho de Estado, e o Desembargo do Paço, viestes nisso - e D. Diogo de Castro disse ultimamente que não convinha que por agora se usasse de rigor, nem pôr as cousas como antes, senão il-os reduzindo poucos a poucos, que é o mesmo que a ultima ruina, no estado presente da Monarchia, tão ameaçada e invadida de inimigos estrangeiros, e regra condemnada de todos os politicos, em semelhantes movimentos populares, em passando o primeiro impeto.
De Lisboa, com o crescimento dos alborotos do Algarve, e alguns ruidos do Porto, e Santarem, e alguma cousa em Vianna, me consultaram que arrimasse gente de Castella ao Algarve, e que a Armada do Brazil que ia a Cadiz corresse aquella costa. (...)
Vendo que de Portugal não se davam outros meios, nem executavam os que eu havia mandado por maior favor d' aquelle Reino, senão sómente o de arrimar gente de Castella; (...) - hei mandado prevenir ao Duque de Bejare, com Dom Diogo de Cardenas, do meu Conselho de Guerra, com a gente da Estremadura, e ordenado ao Duque de Nochera, e mais Cavalleria de Couraças, Arcabuzeiros, e Dragões, na volta de Badajoz.
Tambem tenho ordenado ao Duque de Medina Sidonia, que, com o Marquez de Valparaizo se mova para o Algarve com a gente de Andaluzia que houver mister, e Cavalleria della (...) e que todos os postos e Castellos de Portugal se guarneçam com Infanteria, bastimentos e munições, em toda a fórma (...).
E ainda que se conhece que para os poucos Logares inquietos em duas Provincias, em Portugal, sobeja muito do que está prevenido, pela fidelidade dos bons Vassalos, que tenho nesse Reino, e pela pouca prevenção dos inquietos - se ha considerado que, sendo precisamente necessario aquietar os tumultos dos Povos levantados, de aqui ao Natal; e podendo-se temer que o mau exemplo, empeore cada dia as cousas, e cresça a inquietação - convem que a preenção seja,tal, que não só remedeie o damno presente, senão o que póde occasionar a gente ordinaria, o exemplo dos ruins.
Estando prevenido isto, resolvi informar-me de vós, do Governo, do Conselho de Estado, do Duque de Bragança, dos Fidalgos de Evora, e mais pessoas bem affectas, que residem na parte inquieta, que poderão obrar com inteira seguridade, em o dito tempo, tendo as costas seguras, com a gente que chegar á raia, porque desejo até ao ultimo ponto, sendo possivel, que não se obre por outra mão o que se houver de executar.
Tambem hei ordenado que se juntem os premios que se hão de dar ás Cidades, que hão procedido bem contra as amoestações dos sediciosos.
Fica ajustado o perdão geral, com excepção das pessoas que não hão de deixar de ser castigadas pelo exemplo publico e authoridade de justiça.
E entre tudo isto, o que faz admiração universal é que, depois de se haver perdido o Brazil, sendo conquista desse Reino, com o Governo e Governos que tem havido, não ha sido possivel enviar Armada consideravel dessa Corôa, a tratar de o defender e recobrar, estando em differentes vezes aparelhados muitos navios desta de Castella; e ao tempo de aprestar, ficou pelos Ministros Portuguezes, em tanto grau, que, feita a conta, por esta Corôa de Castella, se ha feito milhão e meio de gasto, em differentes aprestos, para este fim, que ficarão perdidos, por não haver concorrido a Corôa de Portugal.
E não havendo remedio para fazer este despacho, se ha tirado da substancia deste e dos demais Reinos meus, para pôr uma Aramada de vinte Galeões, provida de tudo, que custa mais de um milhão.
E porque não houve quem se encarregasse do apresto das Armadas, o ordenei a quem com effeito o fizesse - e ao tempo de se concluir este, e estar para navegar, não o havendo feito antes, se levantaram os Povos que se vê, a titulo de tributos, ao parecer só para estorvar a partida da Armada - cousa tão rara, com um exemplo tão extraordimario, como é que meus Reinos de Hespanha, e os demais da Monarchia, que tanta carga tem sobre para se livrar dos inimigos presentes, os accrescentem, para que Portugal cobre suas Conquistas - o que os Povos desse Reino se levantem, porque se poem suavissimos, para com isto pôr uma de muitas partes que dá o resto da Monarchia.
E não é muito que admire semelhante enormidade, pois em nenhum tempo se pôde cuidar, nem imaginar tal demonstração de amor, nem de affecto de tantos Reinos, e Provincias de Hespanha, e fóra, que até o dia de hoje não hão recebido nenhuma utilidade, assistencia, nem socorro da Corôa de Portugal.
Tolerando tambem com dissimulação tão graves excessos, encarreguei se tratasse bem da reducção dos sediciosos, encomendando-a á authoridade da Justiça.
E quando vi que esta não era bastante, encarreguei ao Conde Dom Diogo de Castro, Marquez de Ferreira, Conde Vimioso, e aos mais Fidalgos de Evora, que assistindo-a, se executasse o que conviesse.
Havendo respondido elles que suas pessoas sós não podiam fazer sombra á Justiça, no estado em que se achavam as cousas; desejando eu que fosse a mão da Nobreza Portugueza a que sugeitasse essa abominavel sedição - lhes encarreguei levantassem gente com que se separar a sisania do trigo - em que escrevem acham impossibilidade.
Estando nisto a materia, e havendo-se feito por minha tão extraordinarias demonstrações, para reduzir os inquietos por mão dos do mesmo Reino, sem haver deixado de intentar nenhum meio bastante a reprimir esta gente ruim e inquieta:
Recebi uma carta do Povo de Lisboa, em que, condemnando as inquietações dos Logares levantados, com summa estimação, e confirmando-se em sua lealdade, e affecto a meu serviço, me dão graças por assistir com vinte Galeões á restauração do Brazil.
Juntamente se recebeu um papel que vos deu o Conde do Prado, em que, excluindo, pela guerra contra França e Saboya, o celebrar-se Côrtes nesse Reino, propoem o que suppoem ha muitos mezes que vos disse, havendo-o repetido diversas vezes - e é que eu tenha por bem de deixar a esse meu Reino de Portugal, todos os effeitos de minha Fazenda, livres de consignações ordinarias, e as novas composições da meia annata, o qual se applique tudo aos socorros do Brazil - tornando-se uma Junta de todos os Tribunaes, que me consultem tres Fidalgos, naturaes desse Reino, que em vossa presença se juntem cada dia a tratar da recuperação de Pernambuco, e demais Conquistas, e a disposição a cobrança e paga dos effeitos referidos - entrando em arca separada, de donde se não tire um real sem ordem da Junta, que me irá dando conta do que se fôr dispondo, e tomando as ordens do que mais convier - que tudo isto é conforme aos privilegios do Reino, e as condições com que Lisboa e outros Logares aceitaram o Real d ` Agua, e crescimento da quarta parte do Cabeção:
Que de se não fazer isto resulta a queixa geral que ha: e pode ser que as inquietações; pois havendo os Povos concorrido de sua parte com tudo o que nesta se lhes ordenou até agora, não entra o que resulta da extracção do sal na arca destinada para estes gastos; e que, ainda que os que bem intendem, julgam que é muito mais o que gasto nos vinte navios com que assisto à recuperação do Brazil, é tal a desconfiança do Povo, que não admitte razão, e só quer os deixe com o cabedal do Reino, para que gaste na guerra a que elles acudirão.
O Conde considera esta proposta por mui de meu serviço, e mui em favor desta Corôa de Castella, pois, não gastando com a de Portugal, fica por conta desta Corôa tudo o que fôr necessario - em que parece não haver fallencia, porque o Reino tem mui presente a importancia da restauração de Pernambuco - e quando vejam que se gastando o que havia, e que só se pede o que falta, ninguem escusará o dal-o, e as repartições se farão com consentimento e gosto - e se tornará a acceitar o Real d ' Agua, e disporá tudo como convem - e que achando-se com vinte e cinco Galeões armados a Corôa de Portugal, e restaurado o Brazil, poderão passar ás Indias de Castella, ou ao Canal de Inglaterra; e juntando-se com os navios de Dunquerque, fazer guerra ao Olandez, e obrar outros effeitos que promettem o valor e lealdade dos Portuguezes. (...)
E que conformando-me eu o que propoem o Conde, convirá escrevel-o ao Senado da Camara de Lisboa, favorecendo-o e honrando-o, como se deve, pelo amor e lealdade, com que sempre me serve:
E com a copia de minha resolução, aquelle Senado escreverá ás demais Camaras principaes do Reino, encaminhando-as a que agradeçam o favor que lhes faço, e a que tornem a assentar as imposições do Real d ' Agua, e quarta parte do crescimento do Cabeção, que a seu sentir é o meio mais efficaz para que se socegue tudo.
E sendo meu animo, que a quietação desse Reino se procure por todos os meios que poderem escusar os extremos a que obrigam o estado em que hoje se acham os Povos levantados; e reconhecendo juntamente que o que o Povo de Lisboa me escreve, não é conforme ao que me propoem o Conde, em meio da duvida que se offerece ver que quem preside na Camara de Lisboa, se aparta do sentir do Povo, que parece reconhece a summa conveniencia de que Castella lhe assista á recuperação, e conservação de suas Conquistas, havendo gastado tão grandes sommas, em aprestos para isto, ainda que inutilmente, por defeito das disposições dos Ministros Portuguezes, a que equivale com muita mais quantidade, o que ha montado a extracção do sal:
Sendo certo que não haver vindo eu desde logo, em que corresse esta administração como renda de Portugal, ha sido por deter as instancias que justamente me fariam os mais Reinos de minha Monarchia, pois com razão me poderiam representar que, tirando os inimigos communs, do sal que extrahem, cabedal consideravel, só em beneficio de Portugal, crescendo com isto suas forças, os obbrigam a maiores tributos, para se defender delles, sem reparar em que de suas contribuições, e sangue de seus naturaes, se tomam e hão tomado partidas tão grandes para defender suas Conquistas, sem nenhuma utilidade sua, por os não admittir a nenhum genero de accrescentamento nessa Corôa - quando nos de Castella, e demais Reinos de minha Monarchia, occupam os Portuguezes, em seus Conselhos, em minha Casa, e em outras partes, postos grandes - sem que deixem de significar-me, que a desconsolação é grande:
E os Tribunaes que em minha Côrte representam aquellas Provincias, hão tratado de que se faça viva instancia comigo, para o remedio:
E que, pois não participar aos demais de seus officios, mercês e honras, os escuse de contribuir para a Corôa de Portugal, applicando para suas Conquistas o que se reparte entre os naturaes desse Reino, a titulo de bens da Corôa, pois são meus; (...) e eu, pelo amor que tenho a essa Corôa, e particularidade com que hei desejado e procurado seu bem, hei ido temperando todas estas instancias tão bem fundadas, e particularmente dos Reinos da Corôa de Aragão, que julgam por cousa dura, que, não tendo Portugal união com Castella, com quem a tem, nem com elles sirvam parte de suas rendas e serviços para assentos de Armadas, com que se assiste a Portugal - mais quando se acham accommetidos de Francezes, em suas proprias Provincias, como são Catalunha e Sardenha, sem esperar de Portugal nenhum homem, nem um real de socorro.
Não posso negar que a força destas considerações ma fazem grande (...) é causa que haja querido que se intenda nelle o que escreve o Povo de Lisboa e o Conde do Prado, para que se considera qual peza mais para sua conveniencia, no caso presente, e os que podem succeder ao diante; não podendo negar que, se bem me ajustarei no estado presente, ao que parecer a todos, sendo justo, effectivo, e bastante, para recuperar o perdido de suas Conquistas; por escusar a nota de entrar armas de fóra a castigar esta desobediencia:
Não parece que ao discurso offerecia cousa comparavel, o papel do Conde de Prado, à carta do Juiz do Povo, nem em todo, nem em parte.
Porem, communicando-se com os Tribunaes todos, e Camaras obedientes, se me responderá com summa brevidade, porque os accidentes de fóra de Hespanha, a que eu não posso faltar, pedem que isto se conclua a toda a pressa.
E se bem intendo, que a Junta que suppoem o Conde do Prado de tres Fidalgos do Reino, é para que fique na minha nomeação os que hão de ser, consultando-me os Ministros, pois de outra maneira bem se vê que não era eleição que devia propôr tal Vassallo.
E que ainda nesta fórma se deve reparar, como se reduz a um Estado, haverá de ser as contribuições geraes, em que o Ecclesiastico não quererá ficar excluido, nem seria razão o fosse o Povo, que é o que leva a maior carga nos tributos. (...)
E que não pode chegar a mais minha clemencia, que a deixar ao mesmo Reino, precedendo consulta dos Tribunaes delle, e Camaras obedientes, a eleição do meio de maior satisfação, como seja effectivo e bastante para que essa Corôa recuperar suas Conquistas - crendo que a ingratidão dos mal intencionados supprir'a o affecto dos leaes, reduzindo-se a materia ao estado que tinha antes da sedição dos Povos inquietos, e com o exemplo que é justo, e que tanto importa á sua propria honra e reputação.

A Mesa da Consciencia, vendo esta Carta de Sua Magestade, e considerando a materia de que trata, com a attenção e ponderação a que obriga a qualidade della, consulte sobre tudo o que parecer. Lisboa, 7 de Janeiro de 1638                                                                                    
A Princeza Margarida
JJAS, 1634-1640, pp. 134-138.

Sedições de Évora
... Eu El-Rei vos envio muito saudar. Para melhor disposição do que se hade obrar, em o socego das inquietações que houve em alguns logares desse Reino, fui servido, que assistisse em Badajoz um Conselho, e outro em Ayamonte.
E para escusar embaraços ao tratamento, com alguns Ministros, e pessoas, com que se haviam de corresponder tenho ordenado se lhes dê noticia das resoluções, por cartas do Secretario Pedro Guerreiro, que é do Conselho de Badajós, e de Matheus Gonçalves de Medrano, que hade insistir ao de Ayamonte:
Do que me pareceu mandar-vos avisar, para que, conforme a esta ordem, vos correspondaes com os ditos Conselhos, dando-lhes noticia de tudo o que convenha, e tiverdes intendido; e particularmente ao de Badajós, por donde hade correr o tocante ao Alemtejo, e mais logares que inquietaram dessa banda:
Dando-lhes assim mesmo conta dos que se tem reduzido, ou reduzirem, e do tempo em que o fazem, para n'aquelle Conselho se saber, se é antes da publicação do perdão e dos que depois se valeram delle, ou o não acceitarem: E o mesmo fareis a D. Diogo de Cardenas, do meu Conselho de Guerra, a que mandei commeter a prevenção das armas, que se vão arrimando a esse Reino, pela parte de Badajós - avisando-o do que prevenirem os levantados, para que o Duque de Hyjar, com elle, segundo que se lhes der, façam a entrada, conforme as ordens que tenho dado.
E porque hei resoluto, que o gasto que fizer a Cavallaria, nos logares de Castella, o tempo que estiver alojada, seja por conta dos culpados, se fará conta de tudo o que importarem os socorros, e utensilios, que lhes houverem dado:
Mandando assim mais, que nos logares vizinhos á Raya, se tomem hospitaes, donde se trate da cura, e regalo dos enfermos, e que tambem se possa fazer nos que se forem sugeitando, em que não ficar gente portugueza.
E pelo que toca ao Clerigos, e pessoas Religiosas, que houverem tido culpa nos alvorotos que houve, tenho mandado se enviem ao Conselho de Badajós, e se ponham em parte decente, com segurança, para que nomeie Juiz, que conheça de suas causas; e vos quiz avisar disto, para que o tenhaes intendido, e nesta acudaes a tudo o que vos tocar:
E da fórma em que tenho concedido o perdão, e da que se hade ter em sua publicação, e execução, se vos avisará brevemente.
Advertireis, para que assim se possa intender, que tenho mandado, que, estando juntas as tropas, e havendo-se publicado o perdão, se guiem com tal ordem, que aos logares, que se houverem reduzido antes de se publicar, não se lhes faça molestia, senão que tão sómente se aloje nelles a gente que fôr necessaria; procedendo com toda a justificação, e de maneira que experimentem o beneficio que recebem os reduzidos.
E que se aloje a gente nos levantados, segundo a capacidade de cada um, sem entrar, nem chegar, aos que sempre hão estado obedientes; porque minha vontade é, releval-os desta carga, e que sómente se corresponda com as Justiças, para que se assistam no inexcusavel, tendo conta do que recebe, para que se restitua á custa dos culpados.
Não tem data, mas segundo o assunto deve ser do ano de 1640.    
JJAS, 1634-1640, pp. 244-245.

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