Estatutos da Universidade de Coimbra
Titulo III
Das confissões, honestidade, vestido dos
Escolares,
e outras cousas que hão de guardar
Todos os
Estudantes, alem da obrigação da Pascoa de Resurreição, se confessarão tres
vezes no anno, a saber, pelas festas de Todos os Santos, Natal, e Pentecoste. E
para isso haver effeito, o Reitor terá particular cuidado, oito dias antes de
cada uma das ditas festas, de mandar fazer essa notificação pelos Bedeis, nas
lições de Prima e Vespera: e os Mestres, alem desta notificação, lho lembrarão
nas ditas lições, e o Reitor no Conselho. (...) O qual não admittirá Estudante
algum á prova de curso, ou cursos, para terem actos, sem primeiro lhe mostrarem
por assignados de seus confessores, que tem inteiramente cumprido, com o que se
contem neste titulo.
1. Os estudantes andarão honestamente
vestidos, sem seda alguma; mas poderão trazer os chapeos e barretes forrados, e
collares dos mantos, e guarnições de sotainas por dentro; e nas camisas não
trarão abanos, senão collares chãos, sem feitio de rendas, nem bicos, nem
trancinhas, nem de outras guarnições semelhantes, sob pena de dous mil réis,
pagos da Cadêa, ametade para a Confraria, e a outra para quem os accusar. E não
trarão nenhum vestido de sotaina, calças, ou pelote, as côres aqui declaradas,
a saber, amarella, vermelho, encarnado, verde, laranjado, sob pena de perderem
os ditos vestidos, ametade para a Capella, e a outra para o Meirinho, ou Guarda
das Escolas, qual o primeiro o accusar. E porem debaixo das sotainas poderão
traxer gibões, ou jaquetas de pano de côres, para sua saude: com tanto que os
collares não sejam mais, que os das sotainas: nem as mangas mais compridas. E
poderão outrosim, debaixo de botas, ou borzeguins, trazer meias calças de côres
bem cubertas: e em casa, ou pelas ruas
onde pousarem, poderão trazer roupões de côres, com tanto que não sejam das
acima prohibidas: e não terão mais guarnições nos ditos roupões, que as que
permittem as minhas Ordenações.
2. Não poderão trazer barretes de outra
feição, senão redondos, ou de cantos: nem carapaças, senão os que trouxerem dó
no tempo limitado, ou pelas pessoas que o podem trazer, conforme a minha Lei,
sob as penas nella conteudas. E os mantos que houverem de trazer, serão
compridos, ao menos até o artelho.
3. Não trarão capas de capello cerrado,
e trarão manteus de collar, ou de capellos abertos. Porem os criados de
Estudantes poderão ir ouvir ás Escolas com pelotes, e ferragoulos, e chapeos, e
colares de abanos nas camisas, chãos, que não passem de dous dedos. E os
Estudantes pobres poderão trazer o mesmo trajo, tirando os collares das camisas
de abanos.
4. Não trarão golpes, nem entretalhos,
que se vejam em algum vestido, nem piques, golpes, botões, ou fitas em botas,
ou sapatos: e todo o sobredito se cumprirá, sob pena de dous mil, applicados
como fica dito nas sedas e camisas.
5. Nenhum Estudante estará na lição, ou
em algum acto publico, com chapeu na cabeça, sob pena de um cruzado, salvo os
acima ditos.
6. Nenhum Estudante poderá ter besta de
sella, salvo o que tiver cento e cincoenta mil réis de renda ou d ' ahi para
cima: e quem o contrario fizer, perderá a tal besta para o Meirinho da
Universidade, ou Guarda das Escolas, qual primeiro o accusar. E sob a mesma
pena, e mil réis mais para ditas pessoas, por nenhuma via terá cães, nem aves
de caçar, por si, ou por outrem, em casa, ou fora della.
7. Nenhum
estudante indo a pé, poderá trazer comsigo, fóra de casa, mais de um moço, ou
homem que com elle viva, nem em casa poderá ter mais de dous: e indo a cavallo,
poderá levar até tres; e o que o contrario fizer pagará mil réis por cada vez,
ametade para a arca da Universidade, e a outra para o Meirinho, ou Guarda, qual
primeiro o accusar. (...)
Titulo IV
Da defesa das armas
Nenhum
Estudante trará armas offensivas e defensivas, de qualquer sorte que sejam,
ainda que seja faca ou canivete, de dia nem de noite, nas Escolas, nem fóra
dellas, pela Cidade e seus arrebaldes. Nem em sua casa poderão ter arcabuzes,
nem pistoletes; e o Reitor, ou Conservador, lhe mandarão buscar as casas, quando
parecer que convém. E quem o contrario fizer, pela primeira vez perderá as
armas para o Meirinho ou Guarda das Escolas, qual primeiro o accusar, e pela
segunda vez, alem de as perder, estará preso oito dias, e pagará dous mil réis
de pena de Cadêa para a Confraria e accusador. Nem outrosim trarão couras de
anta, nem gualteiras de rebuço, de noite nem de dia, na Cidade nem fóra della,
em logar suspeito, sob as ditas penas e de ser preso e estar na Cadêa todo o
tempo que parecer ao Reitor; e nisso o condemnará o Conservador.(...)
1. E porem sendo os ditos estudantes
achados em tempo de opposições com as ditas armas, de dia ou de noite, serão
logo presos, e estarão na Cadêa todo o tempo da opposição, e ficarão
inhabilitados para poder votar, e pagarão mil réis para o Meirinho, além de
perder as armas, como dito é. E se forem achados com ellas depois de ter votado
estarão na Cadêa um mez, além das mais penas: e não poderá o Reitor dispensar
nellas por causa das opposições.
2. Os criados e familiares dos Lentes e
Estudantes, não entrarão outrosim com as ditas armas, das portas das Escolas
para dentro, sob a dita pena; porém poderão com ellas acompanhar seus amos até
as ditas portas, e espera-los a´hi, sem incorrer em pena alguma. Outrosim não
poderão entrar nos açougues da Universidade com armas, sob a mesma pena.
3. E o Secretario, Mestre de
Ceremonias, Escrivão da Fazenda, e Bedeis, não poderão entrar nas Escolas com
arma alguma, sob pena de as perderem, para o Meirinho ou Guarda; e sendo
contumazes, o Reitor, em Conselho de Deputados e Conselheiros, os castigará
como parecer. Estatutos da Universidade de Coimbra, confirmados por El Rei Dom
Phelippe, primeiro deste nome, nosso Senhor, com licença do Ordinario e Santa
Inquisição, Impresso por Antonio de Barreira, Impressor da Universidade - Anno
MDXCTTT.
JJAS,1648.
1656, pp.201-202.
As mulheres
andarem tapadas
Em Carta Regia
de 10 de Outubro de 1623 - Vi uma consulta do Desembargo do Paço, sobre se
prohibir que mulheres andem tapadas - e por quanto de semelhantes prohibições
se tem visto maior introduccão dos excessos que se pertendem remediar,
apetecendo-lhe o vedado, fareis que com esta advertencia se torne a tratar de
novo a materia no Desembargo do Paço e Conselho d ' Estado, e tomada informação
particular dos termos a que tem chegado o taparem-se as mulheres, de que
qualidade, e em que logares, do que parecer mais conveniente, se façam
consultas, que com o vosso me enviareis.
Christovão
Soares
JJAS, 1620-1623,
p. 102
Mulheres não
usem rebuços
E porque nesta
resolução não está bastantemente declarada a fórma em que se ha de intender e
executar esta prohibição, para que não possa causar confusão, antes com toda a clareza
se proceda no cumprimento della - hei por bem e me praz de declarar por esta,
que nenhuma mulher de qualquer estado e condição que seja, assi nesta Cidade,
como em todas as mais Cidades, Villas, e Logares de meus Reinos, ha de trazer
chapeu com manto, nem manto com rebuço, excepto as regateiras, que, no logar
aonde vendem, poderão ter o dito chapeu: e sómente usarão delle as mulheres que
trouxerem mantilhas; e de nenhum modo haverá manto com chapeu, salvo as
parteiras que andarem mulla.
E para que
assim se observe e execute por todos inviolavelmente, me praz que o Official de
Justiça, que se lhe provar legitimamente dissimulou com mulher tapa, ou com
chapeu, pela primeira vez incorrerá em suspensão de seis mezes, e pela segunda
de um anno, e pela terceira em perdimento do officio - e para quem accusar o
Ministro, Alcaide, ou Official de Justiça, será ametade da comdemnação, que
havia de ter a mulher rebuçada, ou de chapeu: advertindo-lhe primeiro, e
mostrando-lhe a mulher que passe com chapeu ou rebuço; e não querendo elle
condemnal-a, tomará testemunhas, para poder provar sua denunciação.
E porque poderá
succeder que algumas pessoas, por serem poderosas, ou por outro algum respeito
tratem de intimidar as Justiças, para que não executem o conteudo desta Lei -
ordeno e mando que,
qualquer que se
descompozer de obra ou de palavra, tratando mal, ou ameaçando Ministro algum de
Justiça, sobre a execução della, ou lh ' o impida, querendo elles fazer
destapar as mulheres que nella incorrerem, e proceder pelas penas referidas,
sendo Fidalgo, será condemnado em cem mil réis, e dous annos de degredo para
Africa; e as pessoas d'ahi para baixo, em cincoenta mil réis, e quatro annos
para o Brazil - o que assim se executará, sem duvida, nem contradição alguma,
porque assim o hei por bem o meu serviço.
E haverá Livro
para se assentarem as condemnações de dinheiro, e pessoas condemnadas, em cada
Juizo do Crime desta Cidade (...) .
Antonio de
Moraes a fez, em Lisboa, a 20 de Agosto, anno do Nascimento de Nosso Senhor
Jesu Christo, de 1649. Luiz de Abreu de Freitas a fez escrever. Rei.
JJAS,
1648-1656, pp. 46-48.
Mulheres não usem rebuços
E mando aos
Desembargadores, Corregedores, Ouvidores, Juizes e mais Justiças de meus Reinos
e Senhorios, que o façam assim exeutar (...)
Antonio de
Moraes o fez, em Lisboa, a 6 de Outubro de 1649. Luiz de Abreu de Freitas o fez
escrever . - Rei.
JJAS, 1648 -
1656, p.52.
Morte do
Principe D. Teodósio e luto
A esta ora, que
doze e meia do dia, foi Deus servido levar para si o Serenissimo Principe Dom
Theodozio, Nosso Senhor. Manda-me avisar a V. Mercê, para que o faça logo
presente á Casa da Supplicação, que ha de estar fechada quatro dias, em que Sua
Magestade espera que os Ministros, desembaraçados das occupações, encomendem
muito a Deus a alma de Sua Alteza.
Hão-se de
vestir todos de luto, entrando os Escrivães, Carcereiros, e todos os que servem
na Casa da Supplicação / por as Justiças e seus Officiaes, que servem fóra
della, hão de ter aviso pelo Desembargo do Paço) - os Desembargadores e Guardas
á custa das despesas do Tribunal (havendo-as) e os mais á sua - e hade ser de
baeta, com o avesso para fóra.
Os Clerigos e
os Ministros de toga a não hão de mudar; mas a hão de fazer tão comprida, que
por traz arraste um pouco pelo chão – e os que não tem toga, ou não são
Clerigos, hão de trazer capuzes cerrados, trinta dias - e todos, excepto os
Clerigos, carapuças, até o dito termo de trinta dias.
As mesas em que
se despacha hão de estar cobertas de baeta, e o pavimento, quanto cobrem os
assentos em que se assentam os Desembargadores.
E todos os
Ministros hão de vir acompanhar o corpo de Sua Alteza a Belem, a cavallo, até o
Logar, com luto nas bestas; e a pé, com a Misericordia, do Logar até o
Convento.
E o dia em que
hade ser o enterro, terá V. Mercê lembrança de mandar procurar, porque ainda se
não sabe ao certo; mas sempre será amanhã, até ao outro dia, ao mais tardar,
com o favor de Deus, que guarde a V. Mercê muitos annos.
De Alcantara,
15 de Maio de 1653.
E advirta V.
Mercê que os Ministros não vão no acompanhamento em fórma de Tribunal, e por
isso não hade haver precedencias. Pero Vieira da Silva.
JJAS, 1648-
1656, pp. 113-114.
Sobre o
mesmo assunto
Juiz,
Vereadores, e Procurador da Camara da Villa de Santarem : Eu El-Rei vos envio
muito saudar. -Hontem ás doze meia do dia foi Deus servido levar para si o
Principe Dom Theozio, meu sobre todos muito amado e prezado Filho, de que fico
com sentimento igual á perda que recebeu este Reino, na falta de um Principe
tão cheio de todas as virtudes. E porque todos meus Vassalos devem
acompanhar-me com as demonstrações costumadas, resolvi que os Officiaes dessa
Camara, e todos os moradores dessa Villa, que forem Escudeiros, ou tiverem
maior qualidade, tragam roupeta, carapuça, e capuz cerrado, com o avesso para
fóra, que poderão abrir passados trinta dias, e allivial-o passados seis mezes
e tira-lo de todo passado um anno: e as pessoas de menor qualidade tomarão
todas luto, segundo a possibilidade de cada um, e as mulheres o trarão tambem
conforme ao que trouxerem seus maridos, ou pais, ou o deveram trazer, se os
tiveram. E vos ordeno (...)
Escripta em
Alcantara, a 16 de Maio de 16653. - Rei.
Alivie-se o luto pelo Corpo de Deus
Sua Magestade,
que Deus, ha por seu serviço que as subordinadas á Casa da Supplicação, que
trazem capuz, o possam abrir quarta feira, vespera de Deus - e os que não
trazem capuz, possam cortar a fralda no mesmo dia. Deus Guarde a V. M. muitos
annos. Paço a 7 de Junho de 1653. PeroVieira da Silva.
JJAS,
1648-1656, p. 117.
Proibição de
armas curtas a cocheiros, lacaios
e outros
criados de serviço inferiores
Dom Pedro, por
Graça de Deus, Rei de Portugal e dos Algarves, etc. Faço saber aos que esta
minha Lei virem, que, sendo eu informado dos varios excessos, e repetidos
crimes, que Lacaios tem feito nesta Cidade em espaço de poucos dias; e sendo
necessario dar-se prompto remedio á facilidade e ousadia, com que os commetem:
mandei ver e considerar esta materia por Ministros de toda a supposição: e
parecendo que as armas curtas, de que os Lacaios usam, lhes facilitam mais a
occasião para delinquirem, como tinha mostrado a experiencia, em tanta
perturbação da Republica, como em offensa da Justiça; desejando evitar estes
damnos por todos os meios possiveis, para que meus Vassalos vivam em paz e
quietação: fui servido, com o parecer dos do meu Conselho, estabelecer esta
Lei, pela qual mando, que, da publicação della em diante, nenhum Cocheiro,
Liteireiro, Lacaio, Mochila, ou outro algum criado de inferior serviço, possa
trazer adagas, ou armas algumas curtas; nem outrosi bordões, dos quaes usam
desnecessariamente dando-lhes sómente causa para brigas e differenças. E todo o
que fôr achado com as ditas armas, ou bordões, será logo preso e sentenceado
breve e summariamente, por tempo de dous annos, para qualquer das ilhas dos
Açores, ou para a Praça de Mazagão, para onde da Cadêa será levado a cumprir
seu degredo, na primeira embarcação que houver depois da sentença dada.
E para que esta
Lei mais inviolavelmente se guarde, e tenha sua devida execução, encommendo
particularmente a observancia della ao Regedor da Justiça; e mando (...)
Antonio Vaz de
Miranda a fez, em Lisboa, a 18 de Novembro de 1687. Francisco Galvão a fez
escrever. - Rei.
JJAS,
1683-1700, pp.128-129
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