Cortes de Lisboa de 1641
Estado dos Povos
Capitulo CIII
Tambem sera de grande utilidade á
Republica, e bem commum de todo o Reino, mandar Vossa Magestade tratar com Sua
Santidade, que se passe um Breve, para que se annulem os matrimonios
clandestinos, por duas razões: a primeira, por se evitarem muitos juramentos
falsos, que nelles ha; a segunda por razão do grande prejuizo que resulta ás
partes; porque, muitas vezes, está dehonrada a donzella, e tendo já sentenças
em seu favor, e por fraudarem sua justiça, se casam clandestinamente, e perdem
muito as mulheres. Pelo que assim o pedimos a Vossa Magestade, fundados na
disposição do Concilio Tridentino, em quanto defende, e poem pena aos que casam
clandestinamente, que não é remedio bastante para haver emenda nos damnos
irreparaveis que se seguem de ficarem validos estes matrimonios.
Resposta
O que representaes neste Capitulo
é materia universal, disposta pelo Sagrado Concilio Tridentino: e o tempo
poderá dar occasiões em que se possa propôr e tratar com Sua Santidade.
JJAS, 1640-1647, pp. 28 e 43.
Mais providências...
Dom João, por Graça de Deus, Rei
de Portugal e dos Algarves etc ...
Faço saber..., que considerando eu
o excesso com que nestes meus Reinos se tem introduzido os matrimonios clandestinos,
e os grandes damnos que delles seguem a meus Vassalos, na Republica,
perturbações e riscos, sendo este caminho occasionado a se extinguir a Nobreza,
que eu tanto zélo, e desejo vêr conservada em meus vassalos; e havendo
consideração que não são bastantes as penas ecclesiasticas, para se evitarem
estes damnos, e ao que se me pedio nas Côrtes que se celebraram no reino anno
de 1641, e como já no anno de 1615 se havia mandado consuliar no Tribunal do
Paço esta materia; conformando-me com o que outros Reis tem disposto em seus
Reinos, assistindo, por meio de penas impostas, aos Decretos do Santo Concilio
Tridentino, que como Principe Catholico devo mandar executar em meus Reinos e
Senhorios.
Depois de mandar conferir este
negocio (...) ordeno e mando (...) que, da publicação desta em diante contrahir
matrimonio que a Igreja declarar por clandestino, pelo mesmo caso, elles e os
que nelle concorrerem e intervierem, e os que no tal matrimonio forem
testemunhas, incorrerão no perdimento de todos os seus bens, que serão
applicados a meu Fisco Real, e serão desterrados para uma Conquista destes
Reinos, nos quaes não entrarão com pena de morte; e não herdado a herança de
seus pais, ao tempo que o matrimonio clandestino fôr contrahido, o pai e a mãe
o possam deherdar; e qualquer do povo possa accusar este crime, depois de
declarado o tal matrimonio por clandestino no Juizo Ecclesiastico.
E para effeito e execução desta
pena, e para que esta Lei se observe e execute, com o rigor que convém, mando
aos Corregedores etc...,
Dada nesta Cidade de Lisboa a 13
de Novembro. Antonio de Moraes a fez. Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesu
Christo de 1651. Pero Sanches Farinha a fez escrever. - Rei .
JJAS, 1648-1656, pp. 88-89.
Dúvidas do Arcebispo de Lisboa
quanto ao que fazer
a quem casar duas vezes
Reverendo Bispo, Inquesidor Geral,
Amigo - Eu El-Rei vos envio muito saudar. Vi a vossa Carta, em que me daes
conta do que se tem passado com o Arcebispo dessa Cidade de Lisboa sobre a
remissão que duvida fazer das pessoas que as suas justiças prendem, por casar
duas ou mais vezes, sendo viva a primeira mulher; e havendo mandado ver
particularmente a materia, se intendeu que, por ser este delicto mixti fori, e
em que ha logar a prevenção, tendo-a o Arcebispo feito com a prisão dos
culpados, se lhe não pode, conforme a Direito, tirar o conhecimento e castigo
nestes casos. E assim, ainda que nestes Reinos costumam ordinariamente os
Bispos remetter á Inquisição semelhantes causas, todavia aos que as hão querido
retêr, se lhes não tirarão com violencia e censuras; poré, desejando eu que a
Inquisição se conserve nesses Reinos em toda a authoridade e respeito devido -
e tendo consideração a que, com o terror das suas penas e castigos, se refreia
mais a frequencia destes delictos, escrevo ao Arcebispo, na boa fórma que
pareceu conveniente, para elle remetter os presos que tiver culpados neste
caso, como mais em particular intendereis do Marquez Viso-Rei, a quem vai a
Carta para o Arcebispo. Escripta em S. Lourenço a 29 de Junho de 1609 - Rei
JJAS, 1603-1612, p. 29.
Regimento do Santo Officio dos Reinos de Portugal
22 de Outubro de 1640 Bispo Dom
Francisco de Castro
Titulo XV
Dos Bigamos
Penas dos Bigamos
I. Do crime de bigamia se conhece no Santo Officio, conforme á
declaração, que ha do Summo Pontifice, pela presumpção, que resulta contra os
bigamos, de não sentirem bem no Saacramento do Matrimonio (...).Todo o homem ou
mulher... que tendo contrahido primeiro matrimonio por palavras de presente, na
orma do Sagrado Concilio Tridentino, se casar segunda vez, sendo viva a
primeira mulher, ou marido, ou sem ter provavel certeza de sua morte, como de
direito se requer para contrahir segundo matrimonio, será no Santo Officio
perguntada pela tenção, e animo com que commeteu este crime, e comdemnada, que
em Auto publico faça abjuração de leve suspeita na Fé, salvo quando a qualidade
da pessoa, e circunstanscias da culpa, pedirem maior abjuração; e além disso,
sendo pessoa plebea, será açoutada pelas ruas publicas, e degradada para as galés,
por tempo de cinco até sete annos; e sendo mulher vil, terá a mesma pena de
açoutes, e será degradada pelo mesmo tempo para o Reino de Angola, ou partes do
Brazil, segundo parecer aos Inquisidores, com respeito á qualidade da pessoa e
circumstancias da culpa; e sobre tudo terão sua instrucção ordinária, e as
penitencias espirituaes, que parecer que convem.
Bigamo de qualidade
II. E sendo pessoa nobre, que, conforme á Ordenação do Reino, seja
escusa de pena vil, irá degradada de cinco até oito annos para Africa, ou
partes do Brazil.
Bigamia similitudinaria
III. Se alguma pessoa solteira se casar por palavras de presente
com outra, que saiba de certo ser casada, e ter sua mulher, ou marido vivo,
provando-se a sciencia, na fórma que direito se requér, para se haver de
castigar esta culpa por bigamia, abjurará de leve em lugar publico, e será
condemnada em açoutes, e em degredo para galés, por tempo de tres até cinco
annos.
Bigamo Relapso
IV. Sendo alguma pessoa castigada pelo Santo Officio, por culpa de
bigamia, se tornar a cahir na mesma culpa, e no primeiro lapso tiver abjurado
de leve, no segundo fará abjuração de vehemente em Auto publico, e será
condemnada, não sendo nobre, em pena de açoutes, e degredo para galés, por
tempo de oito até dez annos; e sendo mulher, terá mesma pena de açoutes, e
degredo para Angola, ou Brazil e aos relapsos neste crime se imporão
penitencias espirituaes mais rigorosas, que as que lhe foram dadas no primeiro
lapso; (...)
JJAS, 1634-1640, pp. 361-362
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